De Luca

Oclusões Arteriais Agudas

A integridade trófica dos órgãos e tecidos depende, entre outros fatores, da perfusão sanguínea adequada, mantida pelo fluxo normal através das artérias tronculares pérvias. Nas oclusões agudas dessas artérias ocorre redução súbita do suprimento de sangue aos tecidos do que resulta isquemia de intensidades variáveis até necrose.

Quaisquer que sejam suas causas, as oclusões arteriais agudas têm grande importância clínica, seja pela morbidade do acidente, seja por indicarem a existência de doença arterial degenerativa ou inflamatória ou de fontes embologênicas.

O quadro clínico é variável, depende do território acometido: nos troncos supra – aórticos podem causar hemiplegia; nas coronárias, I.A.M.; na mesentérica superior, necrose intestinal e, nos membros inferiores, necrose de extensão variável.

Fisiopatologia
A oclusão súbita de um tronco arterial, seja por êmbolo ou por trombo, origina uma série de alterações que, muitas vezes, constituem fatores mais importantes no desencadeamento de condições isquêmicas em um membro do que a presença do próprio êmbolo ou trombo.

Espasmo arterial
A estimulação mecânica e dilatação súbita da parede arterial pela passagem de êmbolo ou presença de trombo determina reação espástica mais ou menos difusa. Esse arteriospasmo, em sua gênese, tem dupla origem: miogênica e neurogênica.

Nas artérias distribuidoras como, por exemplo, a braquial e a femoral, nas quais a inervação vasomotora é escassa, o espasmo é essencialmente miogênico, decorrendo de contrações autônomas e rítmicas da musculatura lisa parietal. Este espasmo tem caráter segmentar, pois não há influência da inervação simpática.

Nas artérias terminais, ricamente inervadas, ocorre espasmo neurogênico, pois a parede irritada mecanicamente, constitui zona reflexógena com propagação simpática determinando arteriospasmo reflexo.

Quando o espasmo é intenso e extenso, pode representar papel importante na redução do fluxo sanguíneo, dificultar a determinação da sede da oclusão e levar a uma parada do êmbolo em sítio maior do que aquele em que ficaria em condições normais.

Trombose secundária
A obstrução arterial aguda da luz de um grande tronco ocasiona fluxo lento no leito distal pois ele se estabelecerá através de vasos colaterais de pequeno calibre e, consequentemente, oferecem grande resistência à corrente. Com isto, há condições para a formação de trombos secundários.

Velocidade da oclusão
Quando um tronco arterial principal se oclui subitamente, a circulação distal se faz através de vasos de desvio previamente existentes e que não sofreram as alterações anatômicas, que caracterizam os verdadeiros vasos de circulação colateral. É o que ocorre nas embolias dos grandes troncos, determinando isquemia grave.

Em contrapartida, se a instalação da oclusão for lenta, com estenose progressiva da luz do vaso, haverá paulatina queda de pressão intraluminal distal, o que constitui poderoso estímulo para o desenvolvimento da circulação colateral. Em muitos casos de pacientes já portadores de placas de ateroma da luz arterial, o quadro agudo da trombose arterial é pouco significativo, não ocorrendo as manifestações clássicas descritas. Esses doentes passam a apresentar acentuação da sintomatologia isquêmica muscular ao esforço fazendo suspeitar de um agravamento da lesão vascular estenosante preexistente.

Resistência dos tecidos à isquemia
Os tecidos sofrem os efeitos da isquemia aguda na razão direta de sua nobreza. Os nervos são os que apresentam maior sensibilidade à isquemia.

De início apresentam parestesias, sendo que ao cabo de 15 minutos ocorre abolição da sensibilidade tátil e a seguir da térmica e da dolorosa. As alterações decorrentes do comprometimento motor surgem ao fim de 20 a 30 minutos e, após duas horas, o nervo perde todas as suas funções. As alterações histológicas começam a aparecer após seis horas de isquemia, agravando – se progressivamente com o passar do tempo para tornarem – se irreversíveis decorridas 24 a 48 horas do acidente agudo.

O endotélio vascular e os músculos resistem mais que os nervos à isquemia. As primeiras alterações endoteliais surgem em torno de seis horas após o início do quadro. Aparece edema e posteriormente há degeneração da túnica média. As lesões que aparecem na microcirculação decorrentes da isquemia são extremamente importantes desde que eles podem limitar o êxito da revascularização do membro.

Com relação à musculatura esquelética, ao fim de aproximadamente quatro horas começa a ocorrer perda progressiva da contratilidade, atingindo 90% quando decorridas oito a 10 horas do episódio agudo.

No fim de 24 a 48 horas as lesões se tornam irreversíveis, aparecendo degeneração discoide e fragmentação de fibras. A pele, o tecido celular subcutâneo, o tecido ósseo e o cartilaginoso, por possuírem baixo metabolismo, resistem mais à isquemia. Mesmo decorridas 24 a 48 horas podem não existir lesões cutâneas.

Etiologia
Em aproximadamente 95% dos casos o êmbolo se origina do coração. Mais comumente é o átrio esquerdo o local mais frequente da origem do êmbolo, quase sempre na presença de F.A. conseqüente a estenose mitral reumática ou miocardiosclerose.

O ventrículo esquerdo é local frequente de origem de êmbolos, principalmente à partir de trombos murais, que se formam na superfície do endocárdio afetada por um I.A.M., com presença de um aneurisma de ventrículo.

Na endocardite bacteriana podem se desprender fragmentos de válvulas lesadas ou mesmo de vegetações friáveis, originando êmbolos sépticos.
Os aneurismas verdadeiros da aorta abdominal, das artérias poplíteas e os pós – estenóticos favorecem a deposição de trombos em suas paredes.
Menos frequentemente, placas de ateroma fragmentadas podem se desprender ou, quando ulceradas, podem ser sede de trombos murais que, destacando – se, embolizam artérias.

A invasão arterial por tecido tumoral, pode causar embolia periférica. Embolização de um projétil de arma de fogo, é condição pouco frequente.
Condição extremamente rara, é a embolia paradoxal. Ocorre quando à partir de um trombo venoso, formar – se – ia êmbolo que, atingindo o coração direito na presença de forame oval permeável, passaria para a circulação sistêmica obstruindo então um tronco arterial.

A trombose arterial aguda tem como fatores desencadeantes aqueles descritos por Virchow para a T.V.P. . Nas doenças arteriais inflamatórias verifica – se o quadro de trombose arterial aguda.

Os aneurismas arteriais são também susceptíveis à trombose. Outra causa é a dissecção da parede do vaso. As hemopatias favorecem a trombose, especialmente, as poliglobúlicas. Finalmente, os traumatismos arteriais, constituem importante causa de trombose.

Quadro clínico
O quadro clínico da oclusão arterial aguda dos membros dependerá fundamentalmente de sua localização, da extensão da trombose secundária e da capacidade de suplência da circulação colateral, fatores estes que determinarão, em última análise, a extensão e a intensidade da isquemia.

Como o tecido nervoso é o primeiro a sofrer os efeitos da isquemia, as manifestações iniciais são de caráter neurológico. A dor é sintoma constante porém somente em 50% dos casos ela atinge intensidade máxima de início. Sensações parestésicas decorrentes da isquemia nervosa aparecem alguns minutos após a oclusão, sendo o comprometimento motor, às vezes, bastante precoce, manifestando – se por impotência funcional do membro.

Objetivamente se verifica acometimento das várias formas de sensibilidade superficial, ocorrendo hipoestesia tátil, térmica e dolorosa. Paresia costuma surgir precocemente, dependendo evidentemente do grau de isquemia, podendo evoluir desde paresia do ciático políteo externo com “pé caído” até paralisia completa no fim de poucas horas.

Alterações da temperatura cutânea costumam se instalar lentamente. Com relação à cor da pele, podem ser vistas palidez e/ou cianose.

A palidez pode persistir por horas ou mesmo dias e, em geral, o prognóstico é favorável com relação à revascularização do membro. A cianose costuma ser evolução de uma palidez inicial, significando que a trombose secundária se estendeu até o leito capilar. A cianose é, em geral, de prognóstico mais sombrio, desde que a revascularização do membro torna – se mais problemática.

No exame físico, além de se verificar as alterações descritas, a palpação sistemática dos pulsos é quer vai constituir seu ponto fundamental não só para confirmar a hipótese de obstrução arterial, como também para orientar o diagnóstico da localização da oclusão.

Diagnóstico diferencial entre embolia e trombose
Existem dados clínicos e angiográficos que, na maioria dos casos, conduzem ao diagnóstico. Assim as embolias arteriais ocorrem comumente em portadores de lesões valvulares reumáticas com ou sem arritmias, ou em pacientes com I.A.M. prévio com ou sem miocardiopatia ou insuficiência cardíaca, sem queixas anteriores de dor tipo claudicação intermitente no membro afetado.

Já as tromboses agudas, por ocorrerem mais frequentemente em indivíduos com arteriopatia arteriosclerótica, acometem em geral homens com idade superior a 40 anos e com manifestações prévias de isquemia muscular de esforço.

Os aspectos angiográficos característicos de embolia são: localização da obstrução ao nível de bifurcações arteriais, ausência de vasos de circulação colateral desenvolvidos, artérias proximais à oclusão sem alterações parietais, com superfície interna lisa e calibre normal e, com frequência, a imagem classicamente descrita de taça invertida no limite proximal da obstrução.

Diferentemente, na trombose arterial aguda são comuns as lesões arteriais parietais, vasos de circulação colateral desenvolvidos, localização da oclusão em segmento habitualmente sede de ateromatose e secção transversa no limite da obstrução.

Tratamento
De maneira geral pode – se considerar que o tratamento das embolias arteriais periféricas na fase aguda é eminentemente cirúrgico, ao passo que o das tromboses agudas é predominantemente clínico.

Tratamento clínico
O tratamento clínico consta de uma série de medidas que visam fundamentalmente impedir a progressão da trombose secundária e aumentar o fluxo sanguíneo através de circulação colateral.

A progressão da trombose secundária é evitada pelo emprego de heparina pela sua ação imediata, rápido metabolismo e efeitos secundários, antiflogístico e analgésico, úteis. A terapêutica fibrinolítica tem sido empregada por alguns autores porém os resultados obtidos são heterogêneos.

O combate ao vasoespasmo arterial é uma importante medida para promover o incremento do fluxo sanguíneo através dos vasos de circulação colateral. Para tanto o membro afetado deve ser envolvido com algodão com a finalidade de evitar a perda de calor. A utilização de analgésicos e sedativos adequados para combater a dor, que é um fator agravante do vasoespasmo, também representa medida importante para minorá- lo.

Drogas vasodilatadoras são empregadas não somente para promover vasodilatação da circulação colateral como para combater o vasoespasmo.


Tratamento cirúrgico
Embolectomia
Revascularização.

Complicações do tratamento cirúrgico

Alterações da Fisiologia Muscular
A isquemia aguda determina alterações agudas e rápidas na fisiologia muscular favorecendo o aparecimento de produtos metabólicos anaeróbicos e compostos decorrentes da morte celular, havendo então acidose, edema e acúmulo local de mioglobina e de elevadas quantidades de potássio e fósforo.

Quando se restabelece a circulação, notadamente quando o tempo de isquemia foi prolongado, há rápida remoção e entrada na circulação geral desses produtos de degradação muscular. Em consequência, se o território revascularizado for extenso, a reação será imediata e aparecerá choque ou hipotensão grave, hiperpotassemia, mioglobinemia e mioglobinúria com alto grau de acidose metabólica seguida frequentemente de insuficiência renal aguda e microembolias pulmonares.

Quando o tempo de isquemia é menor, as manifestações gerais após restauração do fluxo do membro inferior podem não ser tão graves, predominando as alterações locais como edema e congestão muscular. Quando os músculos com tais alterações estão contidos em compartimentos fechados por aponeurose inextensível, podem ter comprometida sua vitalidade e provocar compressão dos troncos arteriais.

Alterações patológicas após a revascularização
Quando a isquemia é intensa e prolongada, produz alterações nos nervos periféricos, que resultam posteriormente em neurite que se traduz clinicamente por paresias musculares, parestesias e dores muitas vezes de grande intensidade.

Complicações relacionadas com a técnica cirúrgica
Retrombose
Estenose no local da arteriorrafia
Hemorragia
Infecção.


Autor:

Dr. Hussein Amin Orra – CRM 78313
Cirurgião Vascular pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP
Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da USP
Cirurgião Vascular do Hospital Ribeirão Pires
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